quarta-feira, 25 de maio de 2011

'Qui bom qui a minha língua é u purtuguêis'


Maria é uma suíça, filha de italianos. Nós nos conhecemos em fevereiro de 2009 no meu primeiro curso de alemão, pois ela era a professora. Logo que ficamos amigas descobri que ela estudava português-brasileiro e foi então que começamos a fazer uma troca muito positiva para ambas: uma vez por semana nós nos encontramos para estudar alemão e português juntas. É ótimo! Eu tiro muito proveito dos nossos encontros. Maria é uma pessoa fantástica.

Outro dia ela me confessou que sente certa dificuldade com a pronúncia do nosso português, pois nem sempre falamos como escrevemos, o que não ocorre com o alemão. Tive que concordar! Com certeza alemão é uma língua bem complicadinha de se aprender, devido às suas inúmeras regras gramaticais, mas quanto a pronúncia, se você sabe que sons cada combinação de letras produz, não é tão difícil pronunciar corretamente as palavras.

Na semana passada ela trouxe um texto, que eu ainda não conhecia, do nosso famoso Jô Soares. O que ele escreveu deixa clara a diferença entre falar e escrever português e por isso vou postar aqui!

Pois é. U purtuguêis é muinto fáciu di aprender, purqui é uma língua qui a genti iscrevi ixatamenti cumu si fala. Num é cumu inglêis qui dá até vontadi di ri quandu a genti discobri cumu é qui si iscrevi algumas palavras. Im purtuguêis não. É só prestátenção. U alemão pur exemplu. Qué coisa mais doida? Num bate nada cum nada. Até nu espanhol qui é parecidu, si iscrevi muinto diferenti. Qui bom qui a minha língua é u purtuguêis. Quem soubé falá sabi iscrevê. (Jô Soares)

terça-feira, 24 de maio de 2011

Dialeto e idioma - desafios dos imigrantes


Um assunto que está muito em voga ultimamente na parte alemã da Suíça é a questão da obrigatoriedade do professor do jardim de infância falar com seus alunos o dialeto local e não o alemão padrão. Recentemente houve uma votação em Zurique para definir essa questão, pois sempre coube ao professor decidir se seria adotado o dialeto, o idioma ou ambos. A maioria votou a favor do suíço-alemão. Claro que tal decisão se refere diretamente à comunicação entre a criança e o professor, mas de alguma forma nos mostra o quanto o dialeto é importante para o país e qual a relação que os suíços possuem com a língua germânica.

Muitos quando chegam aqui não imaginam como é grande a diferença entre o alemão e o suíço-alemão. É lógico que o dialeto deriva do idioma, mas pra quem não tem o domínio de nenhum deles, ambos soam como idiomas individuais. A principal diferença que se pode destacar é o fato do dialeto ser somente falado. 

Outro dia li em um jornal algo sobre esse tema que me intrigou profundamente. Em uma pesquisa feita com os suíços da parte alemã, foi constado que eles consideram o alemão uma língua estrangeira (!), e que a maioria prefere falar francês ou inglês quando não é possível optar pelo dialeto (!). Sempre pensei que como estava na parte germânica da Suíça, não teria muita dificuldade para me integrar ou para me comunicar com as pessoas se eu dominasse o idioma oficial da região, mas de acordo com essa pesquisa eu estava enganada.

Não há dúvidas que existem pessoas muito pacientes, generosas e inteligentes que abrem mão do dialeto para conversar em alemão com um estrangeiro. Conheço várias que agem dessa forma, o que me faz admirá-las ainda mais por isso. Essa atitude de extrema cortesia retrata muito bem a imagem que eu tenho da cultura suíça. Por outro lado, também existem pessoas que acham cansativo manter uma conversa em alemão. Essas podem até tentar, mas logo na segunda frase recorrem ao suíço-alemão, o que deixa os imigrantes novatos com aquela cara de paisagem, ou melhor, com cara de alface murcha.

 Uma coisa é certa, se o indivíduo mora na Suíça-alemã e quer se sentir parte da sociedade precisa também, além de se comunicar com as pessoas, ler jornais, revistas, livros, placas, sinalizações de trânsito, rótulos e embalagens, bulas de remédios, comunicados escolares, correspondências oficiais, contratos, contas, regulamentos em geral, avisos e muito mais. Para isso é necessário saber o idioma, do contrário o cidadão será como um analfabeto sem necessariamente ser. Tem gente que não se importa com isso e que consegue viver assim o resto da vida. Talvez porque vivia assim antes em seu país de origem. Mas os imigrantes, que querem mais da vida e que são perseverantes, conseguirão um dia entender e, quem sabe, falar o suíço-alemão, mas devem começar pelo aprendizado mais árduo que é o alemão escrito, mesmo que isso possa lhe custar alguns anos de estudo. Desafios como esse, nós, brasileiros, tiramos de letra!  ;-)